Presidente Lula, converse com o povo!

Lúcia Iwanow*

“Há décadas em que nada acontece e
há semanas em que décadas acontecem.” Lenin

Em uma semana, acontece o G20; o mercado usa todos os argumentos para o governo federal reduzir os ‘gastos’; vem à luz a notícia de que militares assassinariam Lula, Alkmim e Alexandre de Moares, como prelúdio de um golpe de Estado no Brasil – mais um! –  e, finalmente, no dia de 20 de novembro, o primeiro feriado a lembrar e a celebrar a consciência negra.

“Não possuímos direito maior e mais inalienável do que o direito ao sonho. O único que nenhum ditador pode reduzir ou exterminar?” Amparada na frase de Jorge Amado, o que uma militante velha e cansada de guerra como eu esperaria em seus sonhos mais humildes?

         Esperava, depois disso e de tudo, ver meu Presidente Lula na televisão e nas rádios, em rede nacional, conversando com o povo, coisa que ninguém sabe fazer melhor que ele.

E nessa conversa, ele explicaria ao povo, primeiramente, o que significa G-20. Mostraria a esse povo um Brasil altivo, liderando, conversando de igual para igual com todos os países do mundo, dizendo as urgências da humanidade e aprovando as propostas de soluções que se devem buscar desde ontem, contra a pobreza que desumaniza, contra a destruição do planeta Terra, em andamento devido à usura, à ignorância.

Mostraria um cenário bem diferente daquele em que as lideranças mundiais se esquivavam até de cumprimentar a criatura negacionista que tornava pária o Brasil, pela ascensão da ignorância, da maldade absoluta que é o desprezo à vida dos que deveria amar e defender como dever de ofício.

O Brasil sempre precisou de se orgulhar de si mesmo por muitos motivos e, agora, precisa mais do que nunca.

Mostraria como o combate à pobreza e a fome aprovadas no G-20 se casam com sua negativa, como Presidente da República, em cortar gastos com programas sociais, com a saúde, a educação, a Ciência. Faria valer sua palavra de que o que se gasta para melhorar a vida do povo é investimento e, não, despesa.

Que bom terá sido se Lula explicasse ao povo o que significa ‘mercado’, quem e o quê se escondem por trás do repetido  ‘humores do mercado’.

Não, não estava esperando do Presidente uma aula de economês de especialista pescado pela imprensa corporativa em algum nicho sustentado pela banca. Lula não precisa dessas aulas, pois fala com o povo com maestria.

As políticas sociais de seu governo se dirigem à camada mais vulnerável da população brasileira formadas, majoritariamente, pelo povo preto!

Assim, não haveria como Lula não se referir à motivação do Dia da Consciência Negra, colocando um espelho em frente à maior população negra do mundo, depois da Nigéria, combatendo, vigorosamente, o racismo que vitima brasileiro e brasileira todos os dias do ano há séculos!

Explicaria por que o racismo é cruel, é desumano e, em se tratando de Brasil, é profundamente burro, porque em poucos e poucas de nós corre sangue só de branco.

Quem sabe, a fala de Lula, um não branco, faria o Brasil começar uma história de amor por si mesmo?

“Numa sociedade racista, não basta não ser racista; é preciso ser antirracista!”, disse muito apropriadamente, Ângela Davis. Lula conversaria com o povo sobre a absoluta urgência de não ser racista!

E para concluir, a questão do planejamento de seu assassinato por membros do governo anterior.

Não merece o tema um dedo de prosa com o povo? Prosa daquelas, olho no olho, mostrando a profunda gravidade dessa notícia?

Essa novidade não é grave o bastante para parar o País e dizer, vamos conversar! Temos um assunto importante a tratar hoje! Temos que ter uma conversa para nunca mais a gente esquecer. Uma conversa para impedir que certa História se repita!

Num momento de banalização da violência no País, não é adequado, urgente, inelutável tratar do assunto ‘golpe’?

Golpe militar, golpe em Dilma, golpe em 8 de janeiro de 2023? Quando é que vamos purgar essa ferida? Quando é que o povo vai ser alertado sobre os riscos de uma ditadura?

O planejamento do assassinato de um Presidente, de um vice-Presidente eleitos e de um Ministro da Suprema Corte não pode ser tratado como uma questão pessoal de quem não guarda rancor ou mágoa, o que é louvável.

É preciso não retirar a gravidade que tem um complô contra o Brasil. É preciso tratar a questão com a gravidade que ela tem. Talvez não caiba bom humor nesta discussão; cabe extrema seriedade! Cabe uma conversa séria, franca, amorosa do Presidente da República com o seu povo sobre isso.

Se Lula fala com o mundo todo, por que não falar com o povo? 

Esses assassinatos, não apenas tirariam Lula, Alckmin e Alexandre de Moraes da convivência de suas famílias; em seus corpos sem vida, a morte da democracia no Brasil, dos direitos humanos, da vida no País!

E, no pano de fundo, golpistas clamam por anistia aos golpistas! Querem repetir a farsa da Lei da Anistia, forjada “para anistiar torturadores e torturados”, concedendo perdão ao assassino covarde e à vítima indefesa do Estado brasileiro sequestrado por militares, algo indefensável política, ética e moralmente falando? E isso não será dito ao povo?

Quando o ex-presidente do Brasil, no espetáculo deprimente que foi a sessão da Câmara Federal que acolheu o pedido de impeachment da Presidenta Dilma, homenageou, da tribuna,  Brilhante Ustra, o mais famoso e mais cruel torturador da ditadura militar brasileira e não saiu de lá algemado, quem não esquece da História, vislumbrou dias amargos para o porvir da nação brasileira e esses dias vieram e teimam em não ir embora!

Não é pouco sério alguém, porventura, considerar que a descoberta feita pela Polícia Federal não merece uma conversa de Lula com seu povo?

Insisto: por que após o G-20,  após a pressão do mercado para o corte de ‘gastos’, pressão que não há relativamente aos benefícios fiscais que chegam a bilhões de reais, no Dia da Consciência Negra, uma conquista e um dia de luta, e a descoberta do planejamento do assassinato de Lula, Alckmim e do Ministro Moraes, ainda não houve uma conversa de Lula com o Brasil?

 Não haverá? Assim como não houve quando a direita colocou fogo no Cerrado, na Amazônia, no Pantanal, no Brasil e o Rio Grande do Sul se afogou em águas do desrespeito dos de sempre ao meio ambiente?

O que é que há? Não se quer interromper a programação das tvs e das rádios do deus mercado?

Sendo concessões públicas, esses tipos não têm obrigação de devolver algo em benefício do povo, já que informação correta não está na pauta de nenhum deles?

A narrativa do que aconteceu nesta semana ficará por conta apenas dos articulistas dos jornalões, das tevezonas, das rádios, veículos golpistas, em sua maioria? O governo brasileiro, agente privilegiado e  centro desta narrativa histórica nada tem a dizer?

Ainda é tempo, gente! Aguardemos algum bom senso de quem decide!

*Lúcia Iwanow é professora de literatura aposentada, co-fundadora e ex-dirigente do Sindicato dos Professores no DF, da Central Única dos Trabalhadores e da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação-CNTE.

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